Único pedido de Moraes sobre PL da dosimetria expõe manobra do Congresso para beneficiar golpistas
Ministro do STF não pede anulação do projeto, mas exige transparência e respeito à Constituição em proposta aprovada de madrugada pela Câmara

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), fez um único pedido público a respeito do chamado Projeto de Lei da Dosimetria antes de sua votação na Câmara dos Deputados: que o texto não pudesse ser interpretado como uma anistia e que evitasse brechas que beneficiassem, entre outros, o ex-presidente Jair Bolsonaro.
O pedido do magistrado ocorreu durante tratativas reservadas entre o relator da matéria, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), e integrantes do STF, incluindo também o ministro Dias Toffoli. Moraes destacou a importância de que o projeto mantivesse aspectos técnicos claros e não abrisse margem jurídica para “cara de anistia”.
A proposta foi aprovada pela Câmara na madrugada de quarta-feira, com 291 votos a favor e 148 contra, além de 1 abstenção. O texto seguirá agora para análise no Senado Federal.
O que mudou na dosimetria
O PL aprovado altera critérios de dosimetria penal — ou seja, as regras para cálculo e progressão da pena — para pessoas condenadas pelos atos golpistas e antidemocráticos ocorridos em 8 de janeiro de 2023, em Brasília. Entre as mudanças estão dispositivos que permitem a progressão de regime, inclusive para prisão domiciliar, e a suavização de critérios que, na prática, reduzem alguns efeitos das penas já aplicadas.
A tramitação rápida e a inclusão do projeto na pauta sem aviso prévio ao governo federal geraram irritação no Palácio do Planalto. Auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmaram que a condução da votação intensificou o clima de desconfiança entre o Executivo e o Congresso.
Pressões e debates nos bastidores
Segundo a imprensa, nas conversas preliminares, Moraes fez questão de que o texto não abrisse espaço para uma eventual libertação de Bolsonaro, que foi condenado no âmbito do processo sobre a tentativa de golpe de Estado. Essa preocupação foi levantada para evitar que a redação pudesse ser interpretada como uma forma indireta de perdão aos crimes pelos quais ele e outros réus foram condenados.
Já o ministro Dias Toffoli defendeu a retirada do tipo penal de “abolição violenta do Estado Democrático de Direito”, argumentando que a conduta já estaria abrangida em outras tipificações e que sua manutenção poderia redundar em penas mais severas ou maiores incertezas jurídicas.
O relator Paulinho da Força trabalhou durante cerca de 40 dias para negociar o conteúdo da proposta com representantes do Congresso e com o próprio STF, além de conversar com governistas. A articulação envolveu também os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Repercussão política
A aprovação do PL da Dosimetria provoca debate intenso no meio político. Críticos argumentam que, mesmo sem anistia explícita, a alteração na dosimetria pode resultar na redução de penas e em uma interpretação mais branda da lei para condenados de 8 de janeiro, incluindo o ex-presidente e outros envolvidos em atos antidemocráticos.
A matéria já enfrenta resistência em setores do Senado, onde líderes têm demonstrado cautela. Algumas bancadas defendem que a proposta seja analisada com mais profundidade nas comissões, em vez de ser apreciada diretamente em plenário. A pressão popular e a mobilização social em torno do tema também têm influenciado o debate, com manifestações e discussões nas redes sociais sobre os limites da alteração legislativa e seus impactos institucionais.
