Ex-ministro de Bolsonaro autorizou entidades suspeitas de desviar quase R$ 2 bilhões do INSS
Acordos assinados por ex-ministro e seu sócio no comando de benefícios do INSS abriram espaço para descontos irregulares em aposentadorias, movimentando R$ 1,9 bilhão

Documentos da Polícia Federal e informações reveladas pela imprensa apontam que o ex-ministro da Previdência de Jair Bolsonaro, José Carlos Oliveira, autorizou, quando comandava a área de benefícios do INSS, acordos que teriam permitido o desvio de quase R$ 2 bilhões de aposentados em todo o país. De acordo com reportagem baseada em dados da PF, Oliveira e seu sócio, o ex-dirigente do INSS Edson Yamada, assinaram uma série de Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com entidades hoje investigadas por aplicar descontos indevidos diretamente nos benefícios previdenciários.
Segundo as apurações, foram 10 ACTs firmados com associações suspeitas, abrindo espaço para que essas entidades passassem a fazer cobranças mensais diretamente na folha de pagamento de aposentados e pensionistas. Três desses acordos foram assinados pessoalmente por José Carlos Oliveira quando ele ocupava a Diretoria de Benefícios, setor responsável por autorizar esse tipo de desconto. Os outros sete atos partiram de Edson Yamada, que assumiu a diretoria quando Oliveira se tornou presidente do INSS e permaneceu na função durante o governo Bolsonaro e nos primeiros meses da gestão Lula.
A nova fase da Operação Sem Desconto levou a mandados de busca e apreensão contra Oliveira e Yamada e à prisão de três ex-dirigentes do INSS, entre eles o ex-presidente Alessandro Stefanutto. Por decisão do ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), José Carlos Oliveira passou a usar tornozeleira eletrônica, medida que reforça a gravidade das suspeitas em torno do ex-ministro de Bolsonaro.
As investigações também miram a relação de Oliveira com a Conafer (Confederação Nacional dos Agricultores e Empreendedores Familiares Rurais), entidade apontada pela PF como responsável por mais de R$ 640 milhões desviados do INSS. Em 2021, quando era diretor de Benefícios, ele teria liberado R$ 15,3 milhões à Conafer sem que a confederação apresentasse toda a documentação exigida, o que permitiu a aplicação de descontos considerados irregulares em mais de 650 mil benefícios.
Planilhas financeiras apreendidas na investigação indicam pagamentos suspeitos ligados ao ex-ministro. Em fevereiro de 2023, a PF identificou um repasse de R$ 100 mil vinculado ao codinome “São Paulo Yasser”, que os investigadores associam a Oliveira, hoje convertido ao islamismo e registrado como Ahmed Mohamad. Em mensagens obtidas pelos agentes, o ex-ministro aparece agradecendo um suposto operador financeiro da Conafer após recebimento indevido, ao mesmo tempo em que teria atuado internamente para evitar a suspensão do acordo que mantinha a entidade autorizada a fazer descontos em benefícios.
Além da atuação dentro do INSS, a PF destaca que José Carlos Oliveira e Edson Yamada são sócios na consultoria Oriente, empresa que também tem a filha do ex-ministro, Yasmin Ahmed Oliveira, no quadro societário. Yamada, que foi mantido na diretoria de Benefícios durante o governo Bolsonaro e parte do governo Lula, ainda doou R$ 15 mil para a campanha de Oliveira à Câmara Municipal de São Paulo, em 2024, pelo PSD, o que reforça o vínculo político e empresarial entre os dois.
Servidor do INSS desde 1985, Oliveira construiu carreira de quatro décadas no órgão, passando por chefias em São Paulo até chegar à presidência e, depois, ao posto de ministro da Previdência no fim do governo Bolsonaro. Na semana passada, já sob o peso da investigação, ele foi aposentado, medida que gerou desconfiança entre servidores, que suspeitam de uma tentativa de blindá-lo de um Processo Administrativo Disciplinar em curso na Controladoria-Geral da União (CGU). O INSS, por sua vez, afirmou não ter sido formalmente comunicado da aposentadoria.
A reportagem do Metrópoles, citada pelo Brasil 247, informou que as defesas de José Carlos Oliveira e Edson Yamada foram procuradas, mas não responderam até o momento da publicação. Enquanto isso, o caso reforça a suspeita de que a máquina da Previdência, sob Bolsonaro, foi usada para abrir caminho a associações privadas que sugaram quase R$ 2 bilhões de aposentados, agora no centro da mira da Polícia Federal e do STF.
