Em gravação vazada, parlamentares vinculam decisão de pautar a redução de penas a pressão do governo por liberar recursos orçamentários

Na quarta-feira (10 de dezembro de 2025), durante os debates na Câmara dos Deputados sobre o PL da Dosimetria — que reduz penas de condenados por atos golpistas — parlamentares citaram em conversa captada por câmeras que a decisão de pautar o projeto teria relação direta com o atraso na liberação de emendas impositivas.

Segundo o relato do deputado Léo Prates (PDT-BA), o líder da bancada do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), teria reclamado que apenas 58% das emendas haviam sido pagas. A cobrança teria gerado constrangimento na base governista, levando o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), a afirmar que “precisava de ajuda para pagar”. O desconforto resultou, segundo os deputados, na decisão de pautar imediatamente o PL da Dosimetria.

Para os críticos, a acusação representa um alerta sobre o uso da pauta penal como moeda de troca orçamentária — o que corroeria a legitimidade do processo e aprofundaria a crise institucional no Congresso.

Contexto da votação e justificativas oficiais

O PL da Dosimetria — relatado pelo deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) — foi aprovado na madrugada seguinte à acusação, com votação expressiva no plenário da Câmara. O texto altera as regras de dosimetria e execução penal para condenados por crimes relacionados aos atos golpistas de 2023, o que pode reduzir drasticamente as penas de réus, inclusive ex-lideranças políticas.

O líder do PL, Sóstenes Cavalcante, declarou que a votação do projeto havia recebido aval do ex-presidente Jair Bolsonaro e que o apoio do partido não seria acompanhado de pedidos de emendas em troca.

O presidente da Câmara, Hugo Motta, defendeu que a escolha pela pauta não decorreu de pressão de partidos ou da base bolsonarista, mas da convicção de que o texto estava “maduro” para votação.

Por que a acusação de retaliação gera críticas graves

  • Primeiro, porque se confirmada, a acusação sugere que a pauta penal — em especial para crimes graves contra o Estado Democrático — foi usada como moeda de troca por favores orçamentários: uma instrumentalização perigosa do Legislativo.
  • Segundo, afeta a legitimidade do processo legislativo: decisões que deveriam obedecer a critérios técnicos e jurídicos passam a depender de interesses financeiros e pressões de base.
  • Terceiro, aprofunda a crise institucional de credibilidade do Parlamento num momento em que temas sensíveis (como punições a golpistas, transparência orçamentária e justiça de transição) ganham atenção nacional.

Perspectivas — o que vem pela frente

O PL da Dosimetria agora segue para o Senado, onde sua tramitação será acompanhada de perto. A acusação de que a votação foi motivada por retaliação ao atraso nas emendas pode alimentar contestações políticas, jurídicas e mobilizações da sociedade.

Para analistas e críticos, o episódio reforça o argumento de que a renovação do Legislativo passa necessariamente pela transparência nas pautas, rejeição à barganha orçamentária e fortalecimento do controle social.

Se a denúncia se revelar verdadeira, o episódio poderá entrar para a história como mais um capítulo de uso espúrio do orçamento público como arma de pressão política — com consequências negativas para a democracia.

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