Executivo rejeita proposta de alíquotas diferenciadas, aponta prejuízo bilionário à cultura nacional e defende critérios para proteção da diversidade audiovisual

O governo federal defendeu junto ao Senado Federal que o Projeto de Lei que regulamenta os serviços de streaming e plataformas de vídeo seja mantido com uma alíquota única de 3% sobre a receita bruta dessas empresas, em vez de propostas com alíquotas diferenciadas. A posição foi apresentada em reunião com o relator da proposta, senador Eduardo Gomes (PL-TO), como parte do debate do chamado PL do Streaming, que está em fase final de tramitação no Congresso.

Segundo o Executivo, a cobrança de 3% de contribuição — chamada de Condecine-Streaming — para todas as plataformas que operam no país é a forma mais clara, simples de fiscalizar e capaz de gerar previsibilidade e maior arrecadação para o setor audiovisual brasileiro. O governo rejeitou propostas que previam taxas diferenciadas — como 3% para streaming e 0,8% para plataformas de compartilhamento de vídeo — argumentando que isso reduziria drasticamente os recursos destinados ao Fundo Setorial do Audiovisual (FSA).

Arrecadação e impacto no setor audiovisual

Simulações da Agência Nacional do Cinema (Ancine) citadas pelo governo indicam que um modelo uniforme de 3% pode gerar uma arrecadação aproximada de R$ 2,29 bilhões, enquanto um regime com duas alíquotas distintas poderia arrecadar cerca de R$ 1,39 bilhão — uma diferença próxima de R$ 900 milhões para os cofres do setor. Diante disso, o governo defende a necessidade de manter a proposta mais generosa em termos de recursos para o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA).

O FSA é um fundo nacional administrado pela Ancine e destinado ao financiamento de produções audiovisuais brasileiras por meio de editais públicos e chamadas públicas. A ideia de aumentar a base de contribuição está vinculada justamente à necessidade de ampliar o volume de recursos que sustentam a produção independente e diversa no país.

Pontos defendidos pelo Governo

Além de defender a taxa de 3% para serviços de streaming, a posição do governo incluiu cinco pontos considerados estratégicos para um eventual acordo com o Congresso, que, segundo o Executivo, garantiriam maior proteção à cultura nacional:

  1. Manutenção da Condecine-Remessa, tributo cobrado de empresas brasileiras que remetem recursos ao exterior para pagar por conteúdos audiovisuais, preservando instrumento histórico de financiamento do audiovisual brasileiro.
  2. Exigência de cota mínima de 10% de obras nacionais nos catálogos das plataformas, sem incluir produções próprias de gigantes estrangeiras.
  3. Preservação da janela de exibição nos cinemas, com obrigatoriedade de um intervalo mínimo entre lançamento nas salas e disponibilização no streaming.
  4. Rejeição ao uso de recursos públicos para financiar produções estrangeiras, reforçando a defesa da soberania cultural e a prioridade à produção nacional.
  5. Manutenção da base de cálculo aprovada pela Câmara, com deduções restritas a impostos indiretos.

Segundo nota pública emitida pelo governo, tais pontos são entendidos como “indispensáveis para promover um marco regulatório moderno, justo e alinhado aos interesses públicos e à realidade do setor audiovisual brasileiro”. O documento reafirma que a regulamentação do streaming é considerada estratégica e soberana, com ênfase no equilíbrio entre inovação, diversidade cultural e justiça fiscal.

Debates e pressões no Congresso

A proposta tramita no Senado em um momento de intenso debate entre diferentes interesses políticos, econômicos e culturais. Enquanto parte do setor artístico — incluindo cineastas e produtores — defende uma taxação robusta como forma de fortalecer o cinema e as produções nacionais, há vozes contrárias a qualquer forma de contribuição que possam pressionar preços ao consumidor ou afetar a competitividade das plataformas no mercado global.

Relatos de bastidores indicam que o relator enfrenta pressões de diferentes grupos, incluindo empresas internacionais de tecnologia e streaming, que enxergam na cobrança de novos tributos um potencial impacto negativo nos negócios, e representantes culturais que exigem mecanismos mais protecionistas para o audiovisual brasileiro.

Perspectiva de tramitação

O projeto que cria regras e obrigações para plataformas de streaming e de compartilhamento de conteúdo audiovisual no Brasil foi aprovado em uma versão pela Câmara dos Deputados no ano passado e segue agora para análise no Senado, que deve definir o texto final ainda antes do recesso parlamentar.

Segundo apurações complementares, há movimentações para que o texto final mantenha um equilíbrio entre as demandas de arrecadação cultural e a necessidade de flexibilização que amenize possíveis retaliações internas e externas — incluindo pressões diplomáticas de países onde grandes plataformas estão sediadas.

O que está em jogo

A regulamentação do streaming no Brasil representa uma das questões tributárias e culturais mais significativas na última década no campo audiovisual. A forma como a Condecine-Streaming será implementada pode impactar diretamente não apenas a arrecadação para a produção nacional, mas também o acesso dos consumidores a serviços digitais, a dinâmica de investimentos no setor e a relação entre o Estado e a economia digital.

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