Após acórdão do STF, Padre Kelmon faz oração na porta do condomínio de Bolsonaro e transforma prisão domiciliar em ato performático

A tarde em frente ao condomínio Solar de Brasília, no Jardim Botânico (DF), rendeu mais um capítulo da encenação em torno da prisão domiciliar de Jair Bolsonaro. Vestindo o figurino de sempre e empunhando o discurso religioso, Padre Kelmon (PL-SP) viajou até o Distrito Federal para, segundo ele, “prestar apoio espiritual” ao ex-presidente. Na prática, ficou alguns minutos diante da portaria, fez uma oração rápida à distância e foi embora sem sequer entrar no residencial, já que não tinha autorização do Supremo Tribunal Federal para visitá-lo.

A cena acontece justamente após a publicação, pelo STF, do acórdão que rejeitou os recursos da defesa de Bolsonaro e de outros condenados no caso da trama golpista de 8 de janeiro, abrindo prazo para novos embargos. Enquanto a defesa tenta alongar ao máximo o processo, o entorno político do ex-presidente se esforça para manter viva a narrativa de perseguição e martírio. A visita relâmpago de Kelmon se encaixa como uma luva nesse roteiro.

De acordo com o próprio religioso, a ideia era “interceder” por Bolsonaro em oração, mesmo sem contato direto. Ele admitiu que não formalizou pedido de visita ao STF, o que o impediu de passar da guarita. Ainda assim, tratou o deslocamento como gesto simbólico de solidariedade e aproveitou para reafirmar sua admiração pelo ex-presidente, insistindo que acredita em “mudanças no cenário jurídico”, apesar das sucessivas derrotas na Suprema Corte.

Kelmon também afirmou ter se encontrado com Michelle Bolsonaro e relatou que a ex-primeira-dama estaria “firme” e empenhada em acompanhar a situação do marido, transmitindo confiança aos apoiadores. O relato reforça o esforço do núcleo bolsonarista em posicionar Michelle como figura de estabilidade emocional e possível ativo político, enquanto Bolsonaro permanece isolado e limitado pelas condições da prisão domiciliar.

A passagem do religioso pelo condomínio foi breve. Depois da oração improvisada na frente da portaria, ele retornou a São Paulo. Apesar da rapidez, o gesto repercutiu entre apoiadores de Bolsonaro e alimentou a movimentação em torno do residencial, que vem se transformando em espécie de santuário político informal desde que o ex-presidente foi obrigado a cumprir a pena em casa, em agosto.

No pano de fundo, segue em curso o processo no STF sobre a tentativa de ruptura institucional. Com o julgamento dos primeiros embargos concluído e o acórdão publicado, os advogados de Bolsonaro correm para apresentar novos argumentos dentro do prazo legal, numa estratégia de empurrar o desfecho para frente. Enquanto isso, figuras como Padre Kelmon vão à porta do condomínio, transformando a execução da pena em espetáculo permanente – uma tentativa de manter a base radical mobilizada, mesmo com o líder condenado e trancado em casa.

No fim, a oração do lado de fora do portão diz menos sobre fé e mais sobre a mise-en-scène política que envolve Bolsonaro desde sempre: mesmo na condição de condenado e em prisão domiciliar, o ex-presidente continua tratado como ícone de devoção por aliados que, entre um Pai-Nosso e outro, trabalham para que a narrativa de vítima do sistema siga rendendo capital político.

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