Diploma de soldador dos anos 90 vira peça-chave na defesa de Bolsonaro e tenta mudar narrativa sobre tornozeleira
O ex-presidente apresentou certificado de soldador para alegar que usou os conhecimentos técnicos para “consertar” e não violar a tornozeleira eletrônica

A estratégia de defesa de Jair Messias Bolsonaro ganhou um componente simbólico e técnico ao apresentar um diploma de soldador emitido no fim dos anos 1990 como prova de que ele tinha as habilidades necessárias para manipular eletro-ferramentas — e, segundo advogados, consertar a tornozeleira eletrônica, e não violá-la.
O documento — obtido pela assessoria jurídica — foi emitido entre 1996 e 1997, período em que Bolsonaro já era deputado federal. A defesa argumenta que o curso de soldagem legitima a sua alegação de que o uso do ferro quente sobre o monitoramento eletrônico foi um conserto e não ato de sabotagem.
O laudo da vistoria da tornozeleira eletrônica confirmou danos por queimadura no sensor de integridade do dispositivo, episódio que motivou a prisão preventiva do ex-presidente.
Sob a óptica da defesa, essa linha argumentativa busca desarmar dois pilares da acusação: que houve viagem forjada ou fuga e que se tratou de violação deliberada da tornozeleira. Se Bolsonaro tivesse “tentado consertar”, dizem os advogados, poderia ser interpretado como ausência de dolo para romper o dispositivo — e, então, menor risco ao cumprimento da medida cautelar.
No entanto, do ponto de vista da justiça, a estratégia tem limites: a presença de conhecimentos técnicos não exclui o fato de que o dispositivo foi deliberadamente danificado, conforme relatório da polícia e perícia pendente. A narrativa de conserto é rejeitada por quem entende que a gravidade está no ato de manipulação e no risco que isso representou ao cumprimento da medida de monitoramento.
Politicamente, o episódio revela que o bolsonarismo está em tentativa desesperada de alterar o quadro interpretativo: o ex-presidente que liderou uma trama golpista, virou réu por violar dispositivo judicial, e agora busca se portar como “hobbyista que consertava aparelhos em casa”. Essa inversão de papel – de protagonista da insurreição para homem doméstico com ferro de soldar – pode não convencer além da base fiel, mas é sintomática de uma narrativa em recomposição.
Para nós, brasileiros, a mensagem é clara: não se trata apenas de provar habilidade, mas de redesenhar o enredo. Um réu com tornozeleira que se diz “técnico” e não “fugitivo” tenta roubar o foco da acusação para a técnica — para o “como” em vez do “por que”. Mas a essência permanece: havia risco, havia violação, havia decisão judicial. E o diploma, por mais curioso que seja, não apaga isso.
